Um filme aleatório
Billy The Kid, nascido Henry McCarty, é uma das figuras mais populares da história dos Estados Unidos. É figura certeira na primeira fila da árvore genealógica dos mitos norte-americanos, compartilhando o mesmo nível de Al Capone, John Dillinger e outros, para ficar só nos desobedientes à lei. Tendo vivido apenas vinte e um anos e alguns meses, se tornou uma referência em termos de bandidagem raramente vista até então, e mesmo desde então. Seu campo de atuação não se restringia apenas à nação estadunidense, mas também era figura tarimbada no México. Sua primeira prisão foi aos 14 anos, problema prontamente contornado por ele, ao fugir para o deserto mexicano e dar prosseguimento à sua jornada de punguista. Cometeu seu primeiro homicídio aos 17. Ele influenciou não só toda a cultura western, mas serviu de inspiração para obras magistrais de quadrinhos, como Tex.
Paul Newman ainda não era um astro em maio de 1958. Um de seus filmes de 1956, Marcado pela Sarjeta (Somebody Up There Likes Me), havia alcançado a difícil tarefa de cair no gosto de público e crítica, atraindo alguns olhos para o até então desconhecido ator, mesmo que alguns desses olhares pudessem ter existido apenas pelo ofuscante brilho azul que saltava dos olhos do iminente galã. Marcado pela Sarjeta, em que Newman interpreta o boxeador Rocky Graziano, havia servido para consertar a auto-estima do ator, que havia sofrido um potente cruzado de direita com o fiasco de 1954 chamado Cálice Sagrado (The Silver Chalice), que, de tão ruim, obrigou o ator a publicar um anúncio de página inteira em um jornal de Los Angeles, desculpando-se pela risível atuação. Após as boas resenhas de Marcado pela Sarjeta, Newman era uma estrela ascendente, que se consolidaria em setembro de 1958, com o lançamento do clássico Gata em Teto de Zinco Quente (Cat on a Hot Tin Roof), dividindo atenções com a (ainda) exuberante Liz Taylor e sendo indicado pela primeira vez ao Oscar. Antes do estouro deste, no entanto, Paul filmou uma jóia pouco conhecida, comandada por outra figura em início de carreira cinematográfica, o diretor Arthur Penn.
A mais famosa adaptação da história de vida do pistoleiro Billy The Kid é, muito provavelmente, Pat Garrett & Billy The Kid, de 1973, do estupendo diretor Sam Peckinpah. Até por conta da trilha e participação cênica de Bob Dylan no filme, o que acabou obscurecendo Um De Nós Morrerá, que já não era a mais lembrada das obras cinematográficas, nem mesmo dentro das filmografias de Penn e Newman. Arthur Penn era um elogiado diretor de dramas televisivos, de 35 anos. Ele concebeu o roteiro de Um De Nós Morrerá junto com Leslie Stevens, e, inicialmente, os dois tencionavam entregar o papel ao ícone James Dean, que morrera em 1955. Coube a Paul Newman interpretar essa nova encarnação do lendário fora-da-lei, figura tão carismática e conhecida em solo americano quanto qualquer um dos Kennedys. Na versão de Penn, o criminoso ainda não era conhecido pelo apelido. Era William Bonney, jovem forasteiro que aparece na fazenda do rico proprietário de terras Tunstall (conhecido como “O Inglês”), afirmando estar vagando desde Kansas até aparecer no Condado de Lincoln, no atual estado de Novo México, procurando qualquer tipo de trabalho para matar a fome. Ele é pouco instruído, mas Tunstall confia no rapaz e o emprega. A fama do recém-chegado já não é das melhores, com um dos empregados espalhando uma história de um possível assassinato de Bonney já aos 11 anos de idade, que teria sido cometido no Texas.
Ainda assim, o proprietário simpatiza com o garoto e até começa a ensiná-lo a ler, mas é assassinado pouco depois por um fazendeiro rival, o que instiga ainda mais o instinto sanguinário do jovem Bonney, já naturalmente incendiário. Ele se une a dois capangas, também empregados d’O Inglês, e parte em busca de vingança contra os homens que assassinaram o homem que o acolheu de tão bom grado. Não demora muito para que os cartazes de “Procurado”, existentes em todo o condado, comecem a estampar o nome do rapaz, que, com suas peripécias ilegais, enfim se tornara Billy The Kid. O típico sotaque sulista está sempre presente em todo o filme, e ainda há passagens condizentes com a história real do fora-da-lei, como os primeiros encontros com Pat Garrett, o xerife que vai se tornando descontente com os novos rumos que Billy decidiu seguir e se torna o seu principal antagonista. O título original, Left Handed Gun, se refere à crença de que William era um canhoto e utilizava a mão esquerda para mandar os seus inimigos ao “mais profundo dos infernos”, como ele mesmo diria.
Um De Nós Morrerá foi lançado em maio de 1958, quatro meses antes de Gata do Teto de Zinco Quente, que consagrou definitivamente Paul Newman como figura importante em Hollywood. Os outros atores são ainda mais desconhecidos, portanto, não há astros na película. Talvez por isso não há tantos closes. Penn prefere enquadrar os atores de corpo inteiro ou de longe. Em noventa e oito minutos, acompanhamos as mudanças de humor de Bill Bonney, da arredia presença do começo até o rapaz amargurado e repleto de dúvidas que vai aos poucos suprimindo o personagem anterior. A atuação do protagonista é firme e nos confere a credibilidade necessária para levar em conta a abordagem atípica do diretor, sugerindo novas facetas psicológicas ao notório pistoleiro. Penn não nega que William Bonney é um bandido, e dos mais periculosos. Mas ele sugere algo mais.
Na presente década, tão distante do século XIX que deu luz ao criminoso, você, munido apenas da corriqueira internet e de alguma curiosidade um pouco acima da média, tem acesso fácil ao filme em questão, que é conhecido apenas por alguns cinéfilos dedicados e espalhados pelo mundo. A obra ainda foi engolida pelo sucesso esmagador e subseqüente de Paul Newman e de Penn, que dirigiu, dentre outros, Bonnie & Clyde (com Warren Beaty e Faye Dunaway) em 1967, conseguindo, enfim, ganhar (muito) dinheiro com cinema.
Um comentário:
poxa Willian grande blog!!! foda!!! o nível de informações assuta ehehe parabéns!!
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