segunda-feira, agosto 31, 2009

Sempre há alternativa

A notável cidade de Austin, Texas, revelou ao mundo os seminais Stevie Ray Vaughan e Janis Joplin, além do lisérgico 13th Floor Elevators. Austin possui um slogan próprio, "The Live Music Capital of The World", além de sediar um festival com o curioso nome de “Carnaval Brasileiro”. Também se notabiliza por ser uma localidade tão quente quanto, digamos, Aracaju, com temperaturas ultrapassando os trinta e oito graus no verão. E é de lá que vem uma bandinha que você precisa escutar, caso você já tenha se enchido das quinhentas e doze bandas que copiam o Joy Division e que insistem em surgir.

Foi o clima vulcânico de Austin que originou o White Denim, trio formado em 2006. A sonoridade dos rapazes se caracteriza por um amplo leque de possíveis definições, tendo como palavras-chave o rock de garagem, o soul, o dub e o blues, além de adicionais pitadas de um tempero jazzístico. O terceiro single da banda, Shake Shake Shake, do excelente álbum Workout Holiday, de 2008, seria considerado herege em rodinhas seletas do mainstream, pois contém um evidente, embora curto, solo de... baixo!

O novo disco do conjunto, Fits, lançado em junho, se baseia no mesmo know-how do anterior. Trata-se de um mais uma obra a ser enquadrada com a alcunha (às vezes, pejorativa) de “rock alternativo” ou “indie rock”. No caso desses texanos, não que eles se pareçam ou manuseiem seus instrumentos como os garotos do Fratellis, mas sim por se tratar de uma banda lançada por selos menores. Nada muito traumático.

Apenas uma das faixas de Fits ultrapassa quatro minutos, ora flertando com o rock psicodélico dos conterrâneos já citados, 13th Floor Elevators, ora flertando com o delta blues nativo da nação mais rica das Américas. Tudo isso mantendo como carro-chefe o garage rock, já firmemente ancorado no primeiro single do grupo, a poderosa canção “Let’s Talk About It”. A primeira canção de trabalho do novo álbum, “I Start To Run” é mais comportada e já possui um vídeo facilmente localizável no youtube. Novamente, o baixo de Steve Terebecki é o diferencial. Outros destaques do novo disco de estúdio incluem a curta e objetiva “I’d Have It Just The Way We Were” e “Regina Holding Hands”.

O trio é completado por James Petralli no vocal e nas guitarras e por Joshua Block, na bateria. Indicado a quem está com saudades daquela esquecida convenção chamada rock ‘n roll.

quinta-feira, agosto 27, 2009

Com a benção de Bobby Gillespie e do Globo Repórter

Além do Alice Cooper, as principais peculiaridades estadunidenses dos anos 70 são as costeletas longas e grossas e as medalhas de honra forjadas em metal, concedidas aos derrotados, porém orgulhosos, soldados americanos que se aventuraram na Guerra do Vietnã. Kowalsky detém ambos, além de uma natural predileção por carros velozes. Soa familiar? Não é mera coincidência.

Kowalski (cujo primeiro nome não é revelado no filme), interpretado por Barry Newman, além de “herói” na já citada guerra, também é um ex-policial. Não um policial aposentado, mas um profissional expulso da corporação. Como se não bastassem dois “ex”, ele também foi um corredor automobilístico e motociclista. Alguns flashbacks nos revelam que, depois de todas essas carreiras terem virado pó, o sujeito se conformou em transportar carros para uma oficina localizada na cidade onde ele mora, Denver, no estado do Colorado. Sua nova missão é transportar um Dodge Challenger, ano 1970, de Denver para São Francisco. Kowalski, que, como dito, é um legítimo representante da geração “Born To Be Wild”, promete cumprir o percurso em apenas um dia. Depois de uma infração, ele passa a ser perseguido implacavelmente pela polícia, adquirindo a curiosa simpatia de um dj americano, que detinha acesso à freqüência dos oficiais.

Vanishing Point, de 1971, é, em pura essência, um road movie, repleto de momentos onde se ouve, além da trilha, apenas o ronco do Dodge branco e nada se vê além da vastidão desértica, emulando o clássico livro On The Road, de Jack Kerouac. O filme não tem, nem de longe, a fama de outra obra semelhante, lançada há apenas dois anos antes, Easy Rider (Sem Destino). Uma das explicações prováveis pode ser a presença de Dennis Hopper, que já mantinha alguma fama em 1969, ao que Vanishing Point tinha como protagonista o obscuro Barry Newman. O papel foi inicialmente oferecido ao astro Gene Hackman, mas as negociações se inviabilizaram, pois Hackman já estava ocupado com outro filme lançado no mesmo ano, The French Connection.

Charles Champlin, crítico do Los Angeles Times, chegou a comentar: “Vanishing Point pode ter um ponto, mas... mas... foi perdido”. A solitária jornada de Kowalski rendeu pouco na bilheteria americana (ao contrário da européia, onde obteve boa repercussão), mas se tornou um cult, principalmente na década de 90, quando foi refilmado (e piorado) com a atuação de Viggo Mortensen, o Aragorn de Senhor dos Anéis.

Ignorado pelos americanos na época do lançamento, o filme rende legado (e dividendos) até hoje. Quentin Tarantino, em seu Death Proof, inseriu uma perseguição a um Dodge branco. Um disco homônimo foi lançado pelo cultuado grupo escocês Primal Scream, em 1997. No álbum há uma faixa com o nome do protagonista, que rendeu um videoclipe com script de Irvine Welsh, autor de Trainspotting. O vídeo tem a a espetacular Kate Moss, na época com saudáveis vinte e três anos. Bobby Gillespie, o carismático líder da banda, chegou mesmo a comentar que o álbum se tratava de uma trilha alternativa para o filme. “Por que não compor uma álbum com o verdadeiro tom de humor do filme?”, questionou ele. O extinto Audioslave também buscou bebeu da mesma fonte ao compor o vídeo “Show Me How To Live”. Chris Cornell e companhia também não perderam a oportunidade de dar um rolê num muscle car igualzinho ao do filme.

A trilha sonora da película também merece menção. Country, rock e pop se mesclam em harmonia. Richard Sarafian, o diretor, inicialmente pretendeu incluir grande parte do álbum Motel Shot de Delaney, Bonnie & Friends. Porém, o estúdio não aceitou arcar com a grana necessária para bancar o licenciamento das faixas e uma nova seleção, contendo artistas pouco conhecidos, teve que ser escolhida. O detalhe marcante para os brasileiros, obviamente, é o fato de a faixa Freedom of Expression, do grupo The J.B. Pickers, ser a mesma utilizada na abertura do programa Globo Repórter. Pode procurar a música que você reconhecerá.

Longe de se tornar um clássico alternativo do porte de um Blade Runner, mas tão bom quanto, Vanishing Point é algo a se perpetuar.

terça-feira, agosto 25, 2009

Presente década em vídeos







segunda-feira, agosto 24, 2009

Garth Ennis e o Irish Pride

A Irlanda é um lugar insólito. Esses rapazes detêm uma fibra moral quase que moldada a ferro, fogo, suor e sangue. Desde os fajutos degredados que desembarcavam aos montes na então inacabada Nova Iorque aos duendes beberrões de hoje, os tais irlandeses formam uma casta forte e conscienciosa de suas cicatrizes. Do renomado literato James Joyce aos punks do Stiff Little Fingers.

A nação se encontra em evidência. Seus feriados tradicionais são comemorados em capitais longínquas (sim, Belo Horizonte) e o PIB da parte sul cresceu absurdamente, sendo hoje referência em exportação de softwares.

E é lá nesse caldeirão faiscante que nasce um particular tipo inesquecível, o principal modelador do caráter de alguns aficionados da arte seqüencial e enfant terrible da indústria dos quadrinhos, o roteirista Garth Ennis. Belfast deu vida a esse sujeito em 1970, e desde então é brindada com obras e mais obras de sórdido humor. Nota-se, ao ler suas publicações, que, além de escritor, o norte-irlandês é um pesquisador compulsivo, praticamente um predador literário do Ulster.

A principal obra de Garth é Preacher, uma saga delirante envolvendo figuras cotidianas como um pastor possuído, um vampiro malandro (não por caso, irlandês) e pedófilos em massa. Despejando o tão amaldiçoado humor negro durante toda a sua vida, Garth acabou por se constituir em um baluarte dos pessimistas do globo, até para os que não o conhecem.

Nunca troquei e-mails com Ennis, e provavelmente nunca esbarrarei com ele em alguma viela. Mas, se, em uma parada de metrô, eu trombasse e derrubasse o cidadão, ficaria bastante agradecido em ouvir um “fucking wanka” vindo daquele marginal das letras, cores e formas.

sábado, agosto 22, 2009

Elton John e a esquecida arte de fazer concessões

Elton John gravou uma música para o Alice in Chains, mais especificamente dedicada ao ex-vocalista do conjunto, o falecido Layne Staley. A canção se chama “Black Gives Way to Blue" e estará no disco novo da banda, a ser lançado – oficialmente – em 29 de setembro. Mas não foi extensamente negociado. Elton simplesmente apareceu no estúdio e pediu para conversar com a banda.

O cantor inglês é um homem ocupado. São quarenta e cinco anos de carreira, que lhe renderam vinte e nove álbuns de estúdio. Ele já lançou três outros discos de inéditas nos últimos oito anos. A discografia completa dele, contendo também singles, compilações e eps, é daquelas que, de tão grandes, merecem um artigo próprio na Wikipédia. Na presente década, ele emplacou parcerias com o The Killers e Joss Stone. E até, err, com os Backstreet Boys, em 2000.

Já o Alice in Chains nasceu em Seattle, junto com Pearl Jam e Nirvana, aquela banda que era liderada por você-sabe-quem. Apesar de serem bandas contemporâneas de rock, da mesma cidade, o grupo nunca conseguiu (se é que tentou) ser tão conhecido quanto as duas últimas, além de ter uma pegada diferente, mais metaleira, com letras mais próximas do abismo. Teve o disco Dirt, de 1992, aclamado pela crítica roqueira mundial, mas suas canções nunca foram tão tocadas quanto as contidas em Ten ou Nevermind. Uma rápida pesquisa no google nos revela que tiveram apenas um single no ponto mais alto do pódio, No Excuses, de 1993. Gravaram um disco acústico da MTV, que passou longe da reverberação que suscitou o disco homônimo da banda de Kurt Cobain, apesar de tão qualificado quanto. No entanto, Sir Elton nunca se interessou pelo PJ ou pelo Nirvana a ponto de comparecer, meio que de supetão, aos estúdios dessas, né?

A questão é: Elton John fez valer uma brecha em sua agenda, constantemente ocupada (vide discografia), solicitou o fiel escudeiro Bernie Taupin e foi se encontrar com um grupo reconhecido (mas nem tanto), que vive a polêmica (mas nem tanta) de ressurgir com um novo vocalista, William Duvall (quem?), dono de uma banda punk (definitivamente desconhecida) de Atlanta e suplantar a figura mítica (sim!) do antigo frontman, Staley, que teve morte digna de rockstar de Seattle, ao sofrer uma overdose de heroína, em 2002.

Não adianta você negar ao seu filho ou ao seu irmão menor aqueles trinta minutos diários e fraternais de futebol sem regras, alegando “muito trabalho para fazer”, “compromissos inadiáveis”, “estafa”. Com notícias e fatos pululando de todos os meios possíveis, ele saberá que até Sir Elton John, do alto de seus sessenta e dois anos de (alguns?) excessos e, em meio a incontáveis obrigações da joie de vivre de um popstar, conseguiu algum tempo pra uns sujeitos mal vestidos de Washington.